Carlos Biasi da FAO (esq.), Carlyle Torres Bezerra, da Unesc e Juliano Bueno de Araújo, Coesus Brasil apresentam painéis. Modelo energético e consumista ameaçam terra, água, ar e a produção de alimentos. (Marcelo Luiz Zapelini/Agência Sul 4)

O secretário executivo do Fórum de Mudanças Climáticas e Justiça Social (FMCJS) , Ivo Poletto, disse que um dos objetivos do Seminário Regional (Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul), em Criciúma, de iniciado ontem, 2, é de que as entidades participantes se questionem se podem “fazer algo para mudar a nossa relação com a terra” e “a partir daí começar a desenhar iniciativas locais regionais e quem sabe nacionais”.

Poletto revelou é desejo do FMCJS que a Região Sul “se articule melhor porque está mais próxima de onde está a vida”. Para ele, “o local” é essencial, pois pessoas podem ser envolvidas e passarem por uma “conversão ecológica”, sem se perder vista questões mais amplas.

— Precisamos alimentar o coração das pessoas no sentido de ampliar em sua capacidade de amor não egoísta —, pediu Poletto, que é sociólogo. Para ele, iniciativas nacionais e internacionais também fazem parte da solução de problemas locais.

“Gás da morte”

A extração do gás de xisto por meio do Fracking (fraturamento hidráulico) é um desses desafios. De acordo com fundador da Coesus (Coalizão Não Fracking Brasil e pela Sustentabilidade) e coordenador de Campanhas Climáticas da 350.org, Engenheiro Doutor Juliano Bueno de Araujo, tanto o método como o produtos são mortais. “A água utilizada para produção do gás de Xisto possui mais de 600 produtos químicos muitos deles radioativos e cancerígenos. É um gás da morte”.

— Se conseguem nascer, os bebês sofrem deformações e problemas neurológicos. Uma criança afetada tem três vezes menos capacidade intelectual. Estamos criando uma sub-raça —, explicou o engenheiro. Entre os males que afetam os adultos, estão o câncer e a esterilidade.

Cada poço de Fracking usa cerca de 15 milhões de litros de água, que não possui tratamento possível e acaba afetando o solo e lençóis freáticos.

— O acidente de Mariana vira nada. Nada! Temos 372 “Marianas” acontecendo no Brasil, já estabelecidas e agora teremos 410, com os leilões previstos. Dilma e Temer entregaram a política energética do país nas mãos de corporações interessadas na exploração de Xisto —, avisou Araújo.

Estudos mostram que o gás de Xisto gera 5 vezes mais poluentes do que o carvão e estudos relacionam Fracking à seca, enchentes, furacões e terremotos, como os que aconteceram recentemente em Londrina, no Paraná, onde a prospecção de gás está no início.

— De Santa Catarina eles acabaram de receber o último estudo geológico encomendado pela ANP, que decidiu fazer a exploração nas areias betuminosas catarinenses —, alertou ativista. Como Uruguai iniciou a produção deste gás, a região fronteiriça do Rio Grande do Sul também corre risco.

Araújo elogiou a defesa que a Diocese de Umuarama e a Cáritas fizeram da Lei Municipal que inviabiliza a exploração na cidade do Paraná. Este modelo de resistência é viável, pois o município podem proibir o uso de água para o Xisto.

Insanidade

O professor da Pós Graduação de ciências ambientais da UNESC, Carlyle Torres Bezerra, criticou a manutenção da exploração do carvão na região de Criciúma e o acréscimo de barragens hidrelétricas, que chega a 10 projetadas.

Em sua opinião, se as usinas atuais fossem repotencializadas, novos empreendimentos não seriam necessários. Na produção hidroelétrica, as perdas chegam a 40%.

Bezerra qualificou como “insano o consumismo”, que força produção excessiva de energia. “Pouco tempo atrás vi um anúncio em Balneário Camboriú dizendo: vendemos apartamentos com 6 garagens. Olha que absurdo!”, criticou. Seis garagens, seis carros.

— O modelo de desenvolvimento é baseado no desperdício e no descarte. Esperávamos mudanças nos últimos 13 anos, com os partidos de esquerda no governo, mas não vimos muita diferença: continuou o incentivo ao consumo, para a indústria automobilística e ao Pré-sal. Pra que Pré-sal? Para desenterrar carbono e jogar na natureza.

Alimentos em risco

O funcionário do escritório da FAO/ONU, agrônomo Carlos Biasi, disse que a situação da agricultura é gramática no contexto das mudanças climáticas, “porque o agricultor vive de sua produção, se ela reduz, a sua situação fica muito mais difícil”.

Aquecimento global deve prejudicar a produção de alimentos. A soja pode ser extinta no Sul, a mandioca, assumir do semiárido e o cerrado poderia ser destruído.

— Além disso, com as mudanças climáticas, poderá haver redução das propriedades nutricionais de certos alimentos. É muito provável que minerais como zinco, ferro e alguns aminoácidos diminuam nas plantações e aumente a quantidade de amido e açúcares, que estão diretamente ligados com obesidade —, alertou Biasi.

Soluções

Como estratégia de enfrentamento às questões e da “máfia que está aí “(na liderança da política energética e do modelo de produção), Ivo Poletto sugeriu que as entidades tenham uma “autonomia solidária” umas com as outras e ainda indicou 3 perguntas a serem feitas como critérios de caminhos novos.

— Devemos inverter a ordem das perguntas que fazemos. Primeiro devemos perguntar: o que é melhor para a Terra? Depois: o que é melhor para a comunidade dos seres vivos. E em terceiro: o que é melhor para os seres humanos?

Do ponto de vista da energia boleto ainda indicou que os projetos devem responder a duas perguntas: para quem se produz e para que se produz?
Ao invés da produção centralizada em hidrelétricas, termoelétricas e eólica, ele sugeriu que estações locais de energia solar, da qual o Brasil é autossuficiente, em sua opinião.

O Seminário do Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social termina amanhã, sábado, 4, com apresentação de indicativos de ações das entidades participantes, por estados, e uma manifestação no centro da cidade.

Saiba mais sobre a exploração do gás de xisto

Fracking é o método não convencional altamente poluente para exploração de petróleo e gás de xisto (shale gas) que o governo brasileiro quer implantar no Brasil, sem nenhuma consulta à sociedade, aos prefeitos e vereadores, integrantes dos movimentos social e ambientalista, povos indígenas ou comunidades tradicionais.

No processo são injetados milhões de litros de água, toneladas de areia e um coquetel com mais de 600 produtos químicos para fraturar, quebrar o folhelho pirobetuminoso para liberar o gás metano. Muitos destes produtos são tóxicos, cancerígenos e radioativos. Parte do fluído volta para a superfície pela tubulação e chega às areias de rejeito; outra parte fica no subsolo e percola (sobe) através de microfraturas da rocha até à superfície e também atinge os aquíferos e lençóis freáticos, contaminando o solo e o ar junto com o metano liberado.

Pelo menos 372 cidades em 15 estados podem ser impactadas pela exploração pelo método FRACKING, isto porque a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) já vendeu blocos em várias rodadas de licitações. Destes 15 Estados, o Ministério Público Federal, sensibilizado pela COESUS e parceiros sobre os riscos ambientais, econômicos e sociais, conseguiram suspender liminarmente os efeitos dos leilões em seis. Os demais estados estão à mercê do FRACKING. A contaminação se dá num raio de até 80 quilômetros de cada poço perfurado, provocando um rastro de destruição e contaminação nas cidades vizinhas.