A Assembleia Legislativa de Santa Catarina, através da Comissão de Direitos Humanos, realizou nesta segunda-feira, dia 22 de maio, às 19h, Audiência Pública com o tema da Campanha da Fraternidade 2023 (CF 2023) “Fraternidade e Fome” e com o lema “Dai-lhes vós mesmos de comer!” (Mt 14, 16). Neste ano, a pauta propôs a reflexão e o enfrentamento ao flagelo da fome por meio de compromissos que transformem a realidade a partir do Evangelho de Jesus Cristo.

Padre Antonio Madeira, secretário executivo da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) Regional Sul 4, neste ato, representando Dom Odelir José Magri, bispo de Chapecó e presidente da CNBB em Santa Catarina, leu o texto enviado por ele.

Na carta, dom Odelir ressalta que as CFs têm como objetivos “despertar o espírito comunitário e cristão na busca do bem comum, educar para a vida em fraternidade e renovar a consciência da responsabilidade de todos pela ação evangelizadora, em vista de uma sociedade justa e solidária”. Elenca que a CF 2023 “vem questionar cada pessoa de boa vontade, grupos eclesiais e instituições civis acerca de seu envolvimento com as transformações espirituais, sociais, político-econômicas e ecológicas, a fim de verificar a coerência com o projeto do Reino de Deus mediante a escuta mais atenta e comprometida do Evangelho”. Finaliza a fala citando as Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da CNBB (2019-2023). “Na pastoral, é preciso superar a ideia de que o agir já é uma forma de oração. Quando confundimos agir com rezar, chegamos a abreviar ou dispensar os tempos de oração e de contemplação. Quando reduzimos tudo ao fazer, corremos o risco de nos contentar apenas com reuniões, planejamentos e eventos” (n. 97).

Confira a carta na integra.

 

CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL – CNBB
REGIONAL SUL 4

 

 

Audiência Pública – ALESC
22 de maio de 2023

Saudações ao deputado Padre Pedro Baldissera, autor do requerimento para esta Audiência Pública com o tema da Campanha da Fraternidade deste ano – “Fraternidade e Fome”.

Saudações as demais autoridades presentes e participantes desta audiência.

Em razão de outros compromissos não foi possível estar com vocês hoje, mas agradeço ao Pe. Antônio Madeira, Secretário executivo do Regional Sul 4 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), de Santa Catarina, por me representar nesta audiência pública.

Jesus encheu-se de compaixão

“Ao desembarcar, Jesus viu uma grande multidão. Encheu-se de compaixão por eles e curou os que estavam enfermos” (Mt 14,14). Nos nossos desembarques diários o que vemos? O que sentimos? O que fazemos?

O tema relacionado a fome tem ocupado a pauta de reflexões na Igreja. Neste ano de 2023 com o tema: Fraternidade de Fome e o lema: “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mt 6,34-44), a reflexão foi impulsionada pelo cenário que estamos vivenciando: a crise social, política e econômica e a pandemia sanitária da Covid-19 que agravam a situação de insegurança alimentar e de vulnerabilidade social.

A existência de pessoas que padecem com doenças, fome, pobreza e miséria, por si só, já justifica a necessidade da realização de uma campanha para “fazer irmãos”. A Campanha da Fraternidade (CF), que chegou na 60ª edição, tem como objetivos permanentes despertar o espírito comunitário e cristão na busca do bem comum, educar para a vida em fraternidade e renovar a consciência da responsabilidade de todos pela ação evangelizadora, em vista de uma sociedade justa e solidária.

Seguindo nosso Papa Francisco, que sempre pede para não ceder à cultura da indiferença e afirma que não há vida em plenitude onde falta o alimento básico para a vida digna, este ano fomos novamente convidados a abraçar o mutirão de engajamento em mais uma campanha!

A realidade da fome

O objetivo geral da CF deste ano é: “Sensibilizar a sociedade e a Igreja a enfrentarem o flagelo da fome, sofrido por uma multidão de irmãos e irmãs, por meio de compromissos que transformem esta realidade a partir do Evangelho de Jesus Cristo”. Os objetivos específicos são descritos com nove verbos que, por sua vez, indicam ações: compreender, desvelar, indicar, aprofundar, acolher, investir, estimular, reconhecer e mobilizar.

A CF vem questionar cada pessoa de boa vontade, grupos eclesiais e instituições civis acerca de seu envolvimento com as transformações espirituais, sociais, político-econômicas e ecológicas, a fim de verificar a coerência com o projeto do Reino de Deus mediante a escuta mais atenta e comprometida do Evangelho… No caso do tema deste ano: Fraternidade e Fome, e o lema: “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mt 14,16), é um convite a atitudes de compaixão, partilha, solidariedade e combate à cultura da indiferença. (cf. Texto-Base CF 2023, nn. 1 a 4).

A fome é repudiada por afrontar direta e imediatamente os princípios fundamentais da Doutrina Social da Igreja. Segundo ela, “O amor tem diante de si um vasto campo de trabalho, e a Igreja, nesse campo, quer estar presente também com a sua doutrina social, que diz respeito ao homem todo e se volve a todos os homens” (n. 5).

Mapa da fome da ONU

A fome é um contratestemunho e uma desonra para a humanidade. No ano de 2021, 828 milhões de pessoas passaram fome no mundo. São 61 milhões de brasileiros que enfrentaram dificuldades para se alimentar entre 2019 e 2021. Ao mesmo tempo, o lucro dos grandes bancos atingiu níveis históricos. Os mais ricos do mundo dobraram sua fortuna durante a pandemia. Como entender que isso seja possível?

Números da fome no Brasil

A fome desgraçadamente volta a ser uma realidade em nosso país, depois de chegarmos tão perto de superá-la. Precisamos entender por que hoje mais de 33 milhões de brasileiros passam pelo flagelo da fome, sendo que a cada ano o país bate recordes de produção de milho, soja, trigo, cana de açúcar, carne. Em abril de 2022, apenas 41,3% dos domicílios brasileiros tinha seus moradores em Segurança Alimentar. Em Santa Catarina, apresentada como estado de primeiro mundo, 14% da população passa fome. Você tem dados da realidade da fome no seu município?

Até pouco tempo, a fome era considerada um fenômeno social naturalizado e, por muitos, visto como obra do destino. Portanto, não era considerado obra humana. Provoca indignação quando escutamos afirmações do tipo “Brasil é um país generoso, onde tudo que se planta dá. Passa fome só quem quer.” A verdade é que vivemos numa sociedade capitalista, de classes, onde a fome e a pobreza são produto da exploração!

A CNBB, antes e acima das principais agendas governamentais, já promoveu campanhas com os lemas “Repartir o pão” e “Pão para quem tem fome”, respectivamente nos anos de 1975 e 1985. Os Bispos elencaram estas causas da fome: estrutura fundiária, política agrícola perversa, desemprego e subemprego, perversidade da política salarial, comportamentos morais lamentáveis, extinção do CONSEA (Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional), desmonte do SISAN e esvaziamento da CONAB (Companhia Nacional de abastecimento).

O muito que se tem feito no combate à fome

Sociedade de São Vicente de Paulo; Caritas Brasileira; Movimento Custo de Vida e Contra a Carestia; Pastoral da Criança; Ação da Cidadania na década de 90 (Betinho, Dom Mauro Morelli…) – um projeto criado em Chapecó, com o Comitê, foi o Verde Vida – A Campanha Setembro Verde (Seara), Bancos éticos, Fome Zero (2002), Fundo Nacional de Solidariedade da CNBB, Economia Solidária, de Comunhão e de Francisco e Clara e outras iniciativas.

“Na pastoral, é preciso superar a ideia de que o agir já é uma forma de oração. Quando confundimos agir com rezar, chegamos a abreviar ou dispensar os tempos de oração e de contemplação. Quando reduzimos tudo ao fazer, corremos o risco de nos contentar apenas com reuniões, planejamentos e eventos”. (Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da CNBB, 2019-2023, n. 97)

Na Exortação Apostólica Gaudete et Exultate, o Papa Francisco afirma: “Não podemos propor um ideal de santidade que ignore a injustiça deste mundo, onde alguns festejam, gastam folgadamente e reduzem a sua vida às novidades do consumo, ao mesmo tempo que outros se limitam a olhar de fora enquanto sua vida passa e termina miseravelmente” (GeE, n.101). Por isso a caridade não pode morrer entre nós cristãos. Ela é o nosso distintivo. Se não tiver amor, não vale nada (cf. 1Cor 13,3) tudo o que fizermos.

 

Dom Odelir José Magri
Bispo Diocesano de Chapecó e Presidente da CNBB Sul 4

Por CNBB Sul 4 | Foto: Jaison Alves da Silva